O setor químico tem perspectiva de recuperar a competividade, ganho de eficiência, produtividade e investimentos com a redução de preço do gás natural e sincronismo entre redução do Custo Brasil e abertura comercial
No dia 2 de dezembro foi realizado o 24º Encontro Anual da Indústria Química (ENAIQ), em São Paulo (SP), que reuniu uma plateia de 550 pessoas, composta por empresários e executivos da indústria química. A abertura do evento foi feita pelo presidente do Conselho Diretor da Abiquim, Marcos De Marchi, que destacou o ano difícil de 2019 para o setor químico, com queda na produção e aumento da participação do produto importado no mercado doméstico. Dentre as dificuldades específicas do setor, foi ressaltado pelo executivo o fato do setor ser obrigado a pagar pelo gás natural três a quatro vezes mais do que os concorrentes americanos e o dobro dos europeus, além do “Custo Brasil” que também afeta as empresas brasileiras. “É um sobrecusto de RS 1,5 trilhão ao ano”, aponta De Marchi. Em sua visão, a indústria pode se tornar mais competitiva por meio do programa Novo Mercado de Gás, que deverá criar condições para o setor ter acesso ao gás natural a preços competitivos em linha com o praticado no mercado externo. Ações conjuntas dos poderes executivo e legislativo que incluem as reformas estruturais, os acordos comerciais, a criação das Mesas Executivas da Química, de base e especialidades, pelo Ministério da Economia, ajudam a criar uma perspectiva positiva para os próximos anos.
Na sequência, o secretário do Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação do Ministério da Economia, Caio Megale, se apresentou e garantiu que o processo de abertura comercial será gradual, cuidadoso e não colocará em risco os setores já duramente castigados pelo Custo Brasil. A abertura econômica e a inserção internacional do Brasil são temas importantes para a Abiquim; o setor é um dos mais abertos, com uma presença de 42% de importados no consumo nacional. “Sabemos do problema do ‘Custo Brasil’ e a ideia é mapear esses valores e fazer um programa contínuo para solucioná-los. São 500 anos de acúmulo de distorções, o País tem um custo muito elevado e todos temos o propósito de virar essa página”, declarou Megale que também mencionou: “os próximos passos para promover um ambiente mais competitivo são as reformas Tributária, que deixará o pagamento dos tributos mais simples, e a Administrativa, que reformulará a administração pública”.
Outro convidado foi o diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas, Carlos Langoni. Ele lembrou que a situação de monopólio na exploração e transporte do gás natural criou um ambiente para que o preço do insumo perdesse a competitividade. “Para reverter esta situação é preciso aproveitar o forte aumento de produção de gás natural. É o momento de diversificar essa oferta com grandes atores privados”, disse. A vice-presidente do Conselho Diretor da Associação, Daniela Manique, também subiu ao palco e anunciou que o faturamento do setor em 2019 deve ser de US$ 118,7 bilhões, 4,2% menor que em 2018. O déficit da balança comercial voltou a crescer e deve chegar a US$ 32,1. O volume de produção caiu 3,7% e as vendas internas caíram 1,7% em comparação com o ano passado e a capacidade ociosa atingiu 30% em 2019.
Ao considerar que o Brasil ainda possui a sexta maior indústria química do mundo, mas está se afastando das cinco maiores – China, Estados Unidos, Japão, Alemanha e Coréia -, Daniela lamentou: “nossa matéria-prima, energia, custos logísticos e tributos superam os valores pagos pelas empresas nos países concorrentes”. A executiva ainda destacou que a química consome 25% do gás natural destinado à indústria, o que a torna o segmento que mais consome o insumo. “O programa Novo Mercado do Gás é um alento para promover a competitividade”, sinaliza.
Segundo o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, a partir de 2020 as indústrias sentirão os efeitos da liberação do transporte do gás natural liquefeito. Em seu pronunciamento afirmou: “o Rio de Janeiro já aprovou esse marco regulatório e poderá ser usada toda uma infraestrutura do estado remunerando a distribuidora apenas pelo custo de manutenção de seus gasodutos. A tendência de redução no custo do gás natural para os próximos anos é o choque de competitividade e reindustrialização que revolucionará toda a indústria intensiva em energia, incluindo a química”.
O economista e sócio-executivo da consultoria GO Associados, Gesner de Oliveira, abordou em sua apresentação a importância de se reduzir o “Custo Brasil” para aumentar a competividade das indústrias e dessa forma criar condições para uma inserção comercial responsável, por meio de acordos com outros países, que ocorra por um processo transparente com avaliação de impactos sobre o mercado local.
O presidente do BNDES, Gustavo Montezano, também participou do encontro e explicou que o banco vai “destravar os gargalos necessários para o capital fluir”. Segundo ele, além de manter o apoio para o desenvolvimento da infraestrutura, na próxima década o banco investirá em três setores: saneamento básico, florestas e gás natural. “Neste último tema, o Banco atuará como facilitador para modelar o escoamento do gás e com sua fábrica de projetos para estruturar a privatização das operadoras de gás no Brasil”.
Durante o 24º ENAIQ, o engenheiro Ciro Marino, que desde setembro ocupava a presidência-executiva da Abiquim de forma interina, foi oficializado como presidente-executivo da Associação. Marino é um profundo conhecedor do setor químico, no qual atua desde 1982, e também da Abiquim, pois como primeiro executivo de diversas empresas químicas, é membro do Conselho Diretor há 15 anos. Ciro acredita que o ano de 2020 possa ser interessante, apesar do cenário desafiador. “Em 2020 vamos continuar avançando nas discussões da inserção internacional e na gradualidade desse processo. O governo tem feito um esforço enorme para entender esse “Custo Brasil” e muitas medidas têm sido tomadas em relação ao gás natural, diria eu que em três pilares – preço, disponibilidade e especificação do gás – isso está caminhando e, em minha visão pessoal, em aproximadamente três anos os resultados serão refletidos no mercado brasileiro”, assinala Ciro ao lembrar que a indústria química brasileira tem o mesmo padrão de tecnologia e qualidade, em alguns casos até superior, à média do mercado internacional. “Da porta para dentro as indústrias já são competitivas, um dos problemas são as tarifas, porém, o governo está trabalhando na otimização dos recursos, dos processos de digitalização e as indústrias ganharão eficiência. Particularmente, estou bastante otimista”.
Cenário político – Segundo o deputado federal Alex Manente (Cidadania/SP), presidente da Frente Parlamentar da Química, além de trabalhar na pauta para que o setor tenha acesso a energia e gás competitivos é preciso oferecer segurança jurídica para as empresas investirem no Brasil. “Precisamos combater a corrupção e a impunidade. É hora de mudar isso e ter a segurança jurídica para que todos queiram investir no Brasil”. O diretor superintendente da Umbelino Lôbo Assessoria e Consultoria, Antônio Marcos Umbelino Lôbo, destacou que a pulverização no número de partidos aumentou a importância dos parlamentares e fortaleceu a atuação do Congresso Nacional. “Tivemos uma renovação com parlamentares que têm anseio em conhecer as demandas do setor privado”.
Prêmio Kurt Politzer de Tecnologia
Durante o ENAIQ também foi feita a entrega do prêmio Kurt Politzer de Tecnologia. Na categoria Startup a vencedora foi a T.N.S. Nanotecnologia pelo projeto “Substituição de Solventes Tóxicos e Diminuição do Consumo Energético no Processo Produtivo de Antimicrobianos para a Indústria Têxtil”. A vencedora da categoria Empresa foi a Solvay com o trabalho “EON – Solução Inovadora e Sustentável para Aumento de Produtividade”. Já na categoria Pesquisador, os vencedores foram Frank Nelson Crespilho e Graziela Sedenho pelo projeto “Baterias Orgânicas e Orgometálicas não corrosivas, seguras, sustentáveis e com baixa toxicidade”.
O 24º ENAIQ – Encontro Anual da Indústria Química foi patrocinado pelas empresas: Ambipar Response, BASF, Braskem, Cesari, Croda, Deten, Elekeiroz, Indorama, Innova, Nitro Química, Rhodia Solvay, Oxiteno, Tronox, Unigel, Unipar e White Martins.