GRAFENO: A Especialidade das Especialidades
Considerada a principal inovação da área dos materiais manométricos, o grafeno coleciona uma série de propriedades fantásticas, nunca observadas antes pelos pesquisadores, e pode ser usado em diversas aplicações, como em tintas, demonstrando ser um mercado muito promissor. Em entrevista exclusiva com o MackGraphe – Instituto Mackenzie de Pesquisas em Grafeno e Nanotecnologias do Instituto Presbiteriano Mackenzie (IPM), que foi criado com a visão de transformar o conhecimento nas áreas de nanotecnologia em inovações para o mercado; e através da sugestão e colaboração do químico Paulo Gato e de empresários que estão viabilizando o uso do material em território nacional, a Revista Tintas & Vernizes sai na frente com essa reportagem inédita que busca integrar todos os detalhes do grafeno e da transformação que ele traz ao setor de tintas
Por Francely Morrell e Gabriela Lozasso
Novo e revolucionário, o grafeno surge em cena com propriedades notáveis mostrando que veio para ficar como o futuro da tecnologia. Extremamente resistente, flexível, leve, impermeável (mesmo átomos de Hélio não podem passar por ele) e com condutividade elétrica 100 vezes mais rápida que o cobre, o material não para de surpreender os pesquisadores e inspirar diferentes setores da indústria, com o de tintas e vernizes.
Estamos falando de um nanomaterial bidimensional (com formato de uma folha) constituído apenas por átomos de carbono, ligados em uma estrutura hexagonal que se assemelha a um favo de mel, o grafeno pode ser encontrado naturalmente nos cristais de grafite, que nada mais é que um empilhamento de folhas de grafeno. “A folha de grafeno é aproximadamente 1 milhão de vezes mais fina que um fio de cabelo. Devido às características estruturais deste material, ele apresenta propriedades diferenciadas, como elevada resistência mecânica, alta condutividade elétrica e térmica, transparência, flexibilidade, dentre outras características. Essas propriedades nunca tinham sido observadas conjuntamente em um único material”, informa Camila Marchetti Maroneze, pesquisadora do MackGraphe, centro de nanotecnologia do Instituto Presbiteriano Mackenzie dedicado ao estudo do grafeno, outros nanomateriais e suas aplicações, que hoje possui 31 laboratórios equipados para PD&I orientado ao mercado. Ela também acrescenta que o grafeno é quimicamente inerte e possui uma grande área superficial específica, e, utilizando os princípios da nanotecnologia, pode-se desenvolver aplicações e produtos que se aproveitam de parte dessas propriedades.
Estudos recentes apontam o Brasil como o país que tem a terceira maior reserva de grafite do mundo, com 72 milhões toneladas métricas, ficando atrás apenas da Turquia e da China (fonte: https://idmbrasil.org.br/) e, um dado curioso, é que ambos os termos, grafita e grafite, são utilizados para fazer referência ao mesmo material, a convenção depende do ramo de atuação, sendo mais comum o termo grafita para o setor de mineração, e grafite nas demais áreas.
Aplicação do grafeno em tintas
Atualmente, o grafeno já tem sido utilizado em diferentes aplicações, em especial, no desenvolvimento de compósitos poliméricos, dispositivos de armazenamento de energia, sensores e biossensores, tintas e revestimentos e manufatura aditiva; e já é possível encontrá-lo em componentes do setor automobilístico, aeroespacial, têxtil, plásticos, telefonia móvel, baterias, material desportivo, dentre outros.
Testes estão sendo feitos no segmento de tintas, inclusive, já existem tintas com grafeno sendo comercializadas no mundo. Segundo pesquisas de mercado, o grafeno tem apresentado excelente desempenho na produção de tintas anticorrosivas, tintas condutoras para impressoras inkjets, tintura de tecidos e recobrimento antiestático. Essas tintas têm sido utilizadas no revestimento de embarcações e na impressão de circuitos flexíveis, proteção eletromagnética e tecidos inteligentes.
Camila explica que, utilizando-se o grafeno, a tinta pode melhorar suas propriedades anticorrosivas, antiestáticas e de condutividade térmica, importante, por exemplo, em trocadores de calor. Para a pesquisadora, o grande desafio é saber qual é o melhor tipo de grafeno para se utilizar em cada uma das aplicações e, em determinados casos, funcionalizar o grafeno para que ele possa ser disperso de forma homogênea na tinta.
Além disso, ela acha fundamental escolher o grafeno de fornecedores que tenham a capacidade de fornecer o produto em larga escala; e pontua que a porcentagem de uso do grafeno pode variar bastante dependendo da aplicação final, e precisa ser estudada caso a caso, porém, no geral, revela que as concentrações são muito baixas (inferiores a 1%).
O Engº Wildon Lopes, CEO da Polystell, empresa que está viabilizando o uso de grafeno no Brasil, acrescenta que o material também tem seu espaço em revestimento de aço para substituir o Cromo VI, tintas de impressão condutoras e hidrofóbicas, tintas de dispersões em epóxis e em outros monômeros, tintas para etiquetas RFID, para elementos de aquecimento (em para-brisas de automóveis, por exemplo), assim como em tintas para biosensores, para teclados de computador e telas sensíveis ao toque, em embalagem inteligente de segurança para evitar roubos, tintas de impressão flexográfica de rolo, tintas resistentes ao oxigênio, à umidade, à corrosão e outros riscos ambientais. Wildon inclui ainda a possibilidade de utilização de grafeno em tintas para dissipar o calor de telhados, revestimentos de pisos industriais, tintas decorativas especiais para arquitetura de fachadas e prédios.
Custo do material
E todos devem se perguntar se o grafeno é um material acessível ou tem custo elevado? Na análise da pesquisadora do MackGraphe, isso depende muito da característica do material que se pretende obter. “Existem grafenos esfoliados que são comercializados a USD 200/g e grafenos que são vendidos a USD 70/kg. De qualquer forma, o alto custo da aplicação está mais relacionado à má escolha do insumo do que ao preço do insumo em si”, comenta Camila.
Vale ressaltar que a produção do grafeno em escala comercial é uma realidade. Hoje, no Brasil, já existem produtores que possuem capacidade de produção de nanoplacas de grafeno superior a 1 tonelada/ano e, na China, existem empresas com produtos de alta qualidade e capacidade de produção de centenas de toneladas por ano. Nesse movimento, cabe reforçar a criação de uma nova cadeia de negócios inovadores em torno das aplicações deste nanomaterial nos ambientes automotivo, aeroespacial, de geração e armazenamento de energia, assim como no de sensores, de componentes eletrônicos, telefonia móvel, plásticos e polímeros e o de cimento.
Métodos de produção no Brasil
Camila explica que os métodos de produção de grafeno mais comuns são a esfoliação em fase líquida a partir do grafite e o grafeno sintetizado pelo processo de deposição química em fase vapor (CVD). O óxido de grafeno, um importante derivado do grafeno, é obtido por meio da oxidação do grafite a partir de rotas químicas. Ela menciona que existem ainda laboratórios no Brasil que estudam a preparação de grafeno por crescimento epitaxial sobre carbeto de silício, grafeno molecular, e grafeno flash (produzido a partir de resíduos orgânicos). Além disso, muitos laboratórios de pesquisa acadêmica básica utilizam a técnica da fita adesiva, por meio da qual o grafeno foi isolado com sucesso, pela primeira vez, pelos cientistas Andre Geim e Konstantin Novoselov, agraciados com o prêmio Nobel de física no ano de 2010.
“O sucesso no desenvolvimento das aplicações do grafeno e seus derivados está na sólida relação entre as indústrias e os centros de desenvolvimento de tecnologia, como o MackGraphe, uma vez que o grafeno é um material muito novo, mas que já desponta como uma das tecnologias exponenciais (a nanotecnologia) que pode transformar profundamente a realidade das pessoas”, conclui Camila.
O olhar do químico
A Revista Tintas & Vernizes fez em 2021 uma enquete com especialistas do setor de tintas sobre os temas que gostariam de ver na revista, e o químico sênior, Paulo Fernando Gatto, da Ellu’s Tintas Ltda., sugeriu que fosse abordado sobre o grafeno e foi convidado para contribuir com esta matéria juntamente com outros participantes. Em sua constante busca por novas tecnologias e tipos de tintas funcionais, Gatto conta que teve o conhecimento desta tecnologia em uma tinta espanhola (Graphenstone) e decidiu aplicar em tintas arquitetônicas, especificamente em uma tinta acrílica super premium fosca. “Durante o teste, o primeiro obstáculo foi adequar a expectativa com a realidade, ou seja, o que eu buscava para o produto final e o que era ofertado como matéria-prima. Na sequência, com a matéria-prima que utilizei, a incorporação foi um problema, pois ora criava grumos e ora afetava a tonalidade, além de não obter o desempenho esperado”, revela o químico que pretende retomar novos testes, em breve.
Ele acredita que o grafeno é uma evolução para o mercado, pois pode trazer maior resistência química, física e microbiológica às tintas; e o químico nota que, apesar da existência de ofertas de produtos com base de grafeno, ainda há poucas voltadas para tintas imobiliárias. “As tintas funcionais são o futuro do mercado imobiliário, trazendo para o consumidor, além da personalização, uma utilidade. O grafeno pode ser aplicado em diversas utilidades, além de ser um produto de origem mineral, o que o torna sustentável. Acredito que, muito em breve, teremos mais aplicações para este item e projetos serão desenvolvidos buscando esta inovação”, opina Gatto.
Fornecimento de grafeno no mercado de tintas
Como pudemos notar, o grafeno está fazendo bastante “barulho” e alguns fornecedores do setor de tintas já começam a investir na viabilização do uso desse material no mercado nacional. Uma delas é a Aromat que, através de sua representada norte-americana Micro Powders, está trazendo os óxidos de grafeno, da linha Graphshield, baseada numa tecnologia que forma uma barreira anticorrosiva muito diferenciada. “É uma cera baseada em óxido de grafeno e estamos trabalhando com o produto em duas frentes, uma delas em tintas em pó (cera em pó), e a outra versão é o óxido de grafeno já disperso, de forma líquida, para tintas líquidas, buscando em ambos o atributo de aumentar a resistência de maneira geral, com performance elevada em relação aos anticorrosivos convencionais”, informa Fernando R. S. Rosa, gerente técnico da Aromat.
Ele conta que em testes de comparação, ao deixar uma peça pintada com produto aditivado por muitas horas submersa em ambiente agressivo, ela sofreu pouquíssimos danos. “O grafeno é um material orgânico e traz um benefício maior em relação à resistência, realmente confirmado através dos testes em amostras. No segmento de pó alguns dados já são palpáveis e demonstram essa melhoria, e na área de tintas líquidas estamos trabalhando com mais dados”, ressalta Fernando ao mencionar que já tem clientes do segmento em pó em fase de homologação do produto e, no caso do líquido, encontra-se em período de desenvolvimento com o objetivo de ofertar um produto prático de formular e com performance elevada.
“A Micro Powders é uma empresa que está sempre na vanguarda buscando novidades, focada em pesquisa e desenvolvimento, buscando atender as demandas atuais sejam elas tecnológicas, como no caso do grafeno, ou na parte de sustentabilidade, sendo um parceiro muito importante para nós por estar alinhado aos propósitos da Aromat. Tenho certeza que teremos muito sucesso com a nossa distribuição da linha de grafeno no Brasil”, resume o gerente técnico da Aromat.
A Polystell Aditivos, em parceria com a empresa Gerdau Graphene, também passa a viabilizar o uso do grafeno e, conforme comenta o Engº Wildon Lopes, CEO da Polystell, o objetivo não é só esse, mas também e, principalmente, exfoliar (dispersar e funcionalizar) as nanopartículas em veículos apropriados, de acordo com cada projeto e objetivo das empresas interessadas em todos os setores da indústria brasileira. “O grafeno, pelas suas características quânticas, hidrofobicidade, condutividade térmica e elétrica, resistência mecânica, resistência química e resistência à corrosão, além de possuir uma área superficial maior que 1600 m2/grama, poderá, sem sombra de dúvida, ser a principal inovação do conhecimento na área dos materiais manométricos em aplicações tanto no auxílio aos desenvolvimentos convencionais como também nas novas gerações de produtos de performance”, afirma Wildon ao revelar que a empresa está trabalhando exaustivamente em seus laboratórios e através dos técnicos e doutores especializados das duas empresas parceiras, para abrir um leque de aplicações em diversas ramificações do setor de tintas.
Inicialmente, o foco deste projeto está nas tintas de emulsão acrílicas, vinílicas e epoxídicas alternando com as tintas base solvente, low VOC e com características anticorrosivas, antifouling e pisos industriais. A Gerdau terá o estoque local dos diversos tipos de Grafeno “in natura” e, de acordo com cada projeto, enviará o grafeno correto para a Polystell que, através de equipamentos especiais, fará a exfoliação (dispersão) e/ou a funcionalização das nanopartículas, obtendo assim a melhor compatibilidade para a aplicação destinada. Ambas as empresas já possuem um corpo técnico (engenheiros e doutores), especializados em caracterização nanotecnológica e aplicação de grafeno, com a amplitude que o mercado necessita.
“A Polystell Aditivos tem orgulho de ser a escolhida como parceira tecnológica da Gerdau Graphene e já está preparada para os diversos desenvolvimentos que, com certeza, trabalhará arduamente para alcançar as metas de negócios para o biênio 2022/2023. No final de 2021, a Polystell Aditivos foi consagrada como 1º Lugar em Inovação, no prêmio Top of Mind, da Associação Latino Americana de Materiais Compósitos (ALMACO), e isso nos traz mais responsabilidade para grandes desenvolvimentos no setor de tintas e vernizes, que já se mostra um mercado muito promissor para as aplicações com grafeno”, avalia o CEO da Polystell.
Wildon explica que somente se consegue a incorporação do grafeno aos materiais mais adequados e compatíveis, realizando a sua “funcionalização” e “exfoliação” ou seja, a introdução de Aditivos que incorporam grupos funcionais na sua superfície, unindo-os através das ligações covalentes ou através das folhas de grafeno monocamadas, permitindo-se assim alcançar as propriedades finais desejadas. E ele revela que a empresa está trabalhando em um percentual que viabilize economicamente o uso do grafeno e no melhor custo/benefício. Segundo o executivo, a empresa terá uma solução capaz de compatibilizar o grafeno para quaisquer aplicações onde se deseja a melhor performance, e ele avisa que a Abrafati 2022 será uma oportunidade de mostrar ao Brasil o mais novo e revolucionário material já desenvolvido no mundo. “Polystell e Gerdau Graphene, estarão juntos fazendo o maior barulho possível, mas não deixaremos de mostrar toda a linha dos nossos aditivos de performance que já estão fazendo sucesso nas maiores e melhores empresas de tintas do país”.